sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

ABRIL OUTONAL

Tanta festa, tanta alegria,
Naquele abril libertador,
Depois de tanta euforia,
E de gente sem pudor,
Veio a surpresa, a agonia,
A fome, a miséria e a dor.
              
Agora, do topo da minha colina:
Onde, desesperado, me refugiei,
Fugindo à crueldade citadina,
E a tantas agruras que nem sei,
Vejo a minha pátria em ruína;
Escuto agrestes, os ventos,
Que em rabugenta surdina,
Anunciam os tormentos,
De uma terra que declina;
Oiço um povo acabrunhado,
Que sofre e abomina,
Ser pobre e mal tratado,
Mas vai carregando a sina,
Num murmúrio mal-amado,
Ainda assim não desatina,
Pois sofrer é o seu triste fado.

Aristides B. Victor

POEMA A UM AMIGO

                            ...

Vivemos muitas jornadas percorrendo os montes,
Buscando exercício e as perdizes bravias.
Bebíamos os dois água no chafurdo das fontes,
Agora, sobram apenas recordações desses dias.

Foi naquele bosque sombrio, sinistro e denso,
Que a fera arremeteu, um javali feio e torto.
E veio a ira, o desespero, e um adeus imenso,
Acabava de perder um amigo, estavas morto.

Agora, quando a custo volto àqueles montes,
Não me movimento da mesma maneira.
Já não bebemos água das mesmas fontes,
Nem comemos o farnel da mesma lancheira.

                        ...

Ao regressares com a perdiz ferida,
Que se acoitara na grande silveira,
Beijei-te, como a uma pessoa querida,
Retribuindo uma afeição verdadeira.

Quando me afoitei na torrente fluvial,
Entraste em pânico e acudiste,
Com a dádiva da amizade de animal,
Que entre os homens já não existe.

                     
                            ...


Aristides B.Victor
In Poiesis, volume XX, Editorial Minerva.